terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

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Quando acordei, estava em um tipo de caverna em que o cheiro era o pior que se pode imaginar, ali a escuridão predominava, pois as luzes eram artificiais e muito fracas. Das paredes de pedra escura escorria um líquido parecido com lama e que, posteriormente, descobri que provinha dos pensamentos que se formavam naquela região. Nesse cenário lamentável fiquei acorrentado, a uma das paredes da caverna. A agitação era constante dentre os espíritos que ali trabalhavam, em funções de organização. Em alguns deles existiam fios prateados, que descobri se tratar do que ligava o perispírito ao corpo dos ainda vivos. Isso mesmo, meus amigos, há muitos dentre os encarnados trabalhando para o mau, enquanto seu corpo físico descansa. Gritos de dor eram ouvidos o tempo todo, os espíritos vestidos de preto batiam em muitos dos que ali se encontravam. Eu estava com muito medo, chorava e maldizia meu destino, enquanto meu estômago não dava trégua e por várias vezes vomitei sangue. Um dos prisioneiros, vestido de terno e gravata, se aproximou de mim. Era um senhor branco, muito lúcido, mas de olhos assustados, que segurava na mão um livro que devia ser uma Bíblia: – Olá amigo, estamos no inferno, mas pela suas roupas julgo que o amigo era praticante de rituais demoníacos e merecia estar aqui, mas eu fui um servo de Deus, não sei o porquê de eu estar sofrendo nesse lugar – disse-me o homem. Alguns dos meus algozes riram, eu não respondia, meu desespero não me permitia isso, porém, uma senhora do outro lado da parede com uma feição serena e um lindo sorriso no rosto nos explicou: – Meus amigos, não foram suas religiões ou nosso Deus que nos trouxe aqui, mas sim nossas ações. Foram elas que nos colocaram em tal situação, quando vosso orgulho realmente ceder e reconhecerdes que quando encarnados realmente erramos e violamos a lei de Deus, então, a ajuda virá, por ora, tenhamos paciência e procuremos aprender. – Se você tem este conhecimento, o que está fazendo aqui? Foi o que perguntei. A bondosa mulher, respondeu-me: – Manoel, meu amigo, eu não estou. E evaporou-se em meio a uma fumaça branca. – Acorda seu verme. Usando as pontas dos pés um dos trabalhadores me acordava. Eu ainda estava na caverna, mas, como tinha sonhado, me encontrava mais calmo. Porém, também me perguntava: – Como um morto pode sonhar? Eu e minha ignorância! Não sabia que muito iria ainda me surpreender. Fui colocado em uma fila com outros prisioneiros e comecei a ser levado pelos corredores daquela caverna. Passei por vários setores: alguns com máquinas estranhas, outros pareciam depósitos de ovoides e eu me perguntava para que serviriam aqueles ovos enormes. Passei por alas que pareciam carceragens, onde espíritos atrás das grades, enlouquecidos, gritavam e pediam ajuda desesperadamente. Por fim, chegamos a uma plataforma onde estava estacionado um tipo de trem de carga. Fomos jogados dentro de um dos vagões, acorrentados, ficamos sentados no chão. Um trabalhador apenas com sua imposição de mãos fez nossas correntes se abrirem e ficamos livres para nos movimentar, mas nenhum de nós se atreveu a fazê-lo. Pratos com algo parecido com a lama que escorria pelas paredes foram servidos e fomos orientados a comer: – Comam seus miseráveis, pois apesar de estarem mortos, seus corpos perispirituais ainda necessitam de alimento. Muitas questões pipocavam na minha cabeça, mas achei melhor seguir o conselho da moça do meu sonho e ter paciência. Um homem que mais parecia um antigo capitão do mato, calçado com botas e vestido apenas com calças pretas, sem camisa, trazia na cabeça um chapéu de couro e um chicote na mão, seus olhos eram cinza, quase transparentes. Ao aparecer no vagão, nos fitou com um sorriso malicioso. Meu corpo tremeu, pois parecia que eu seria sugado para dentro daqueles olhos, tamanha era a energia, de desespero, de dor e de maldade que aquele ser exalava: – Senhores, bem-vindos ao meu trem. Começaremos uma viagem que muitos de vocês não terminarão, pois enlouquecerão antes de chegar ao nosso destino e desejarão a segunda morte! Não tentem fugir, pulando pela janela, pois as energias que se encontram lá fora são muito piores que as daqui e vocês seriam destruídos em segundos. Pensam que estão sofrendo? Saibam que nada é comparado a estar perdido nas profundezas do inferno! Que vocês façam uma boa viagem! Ele soltou uma gargalhada e o trem começou a se movimentar em alta velocidade. Faríamos uma viagem que mudaria nosso destino...

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

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Dormi mais uma vez, com a certeza de que o fim seria aquela escuridão, e até me confortei de alguma forma, pois já não escutava nada além dos meus pensamentos. No entanto, nem tudo é como queremos. Acordei diante do mesmo cenário desesperador para mim, onde ao lado do meu caixão, no plano físico, as pessoas desmaiavam, choravam e aplaudiam. O hino de Oxalá era entoado a cada instante e meu desespero voltou a aflorar, só que desta vez eu me revoltava contra os Guias e Orixás, porque eles deixaram que eu morresse. “Oxalá, cadê você que nada fez? Seu maldito!” Pobre de mim, era um infeliz, querendo ser imortal no corpo físico. Maria se aproximou de mim e eu a questionei aos berros e com insultos: – Maria, por que mandaram você e não o próprio Oxalá? Ele está com medo de mim? Ela, calma, me disse: – Manoel, tudo no seu momento, não se revolte com coisas tão pequenas e já sem importância para você nesse instante. Seus laços com o corpo já foram cortados, iremos retirá-lo daqui e levá-lo a um lugar mais calmo. Nesse momento, senti meu corpo frio e, a cada segundo que passava, mais gelado ele ficava. – Não, eu não sairei daqui. Já que não significo nada para Oxalá, a quem dediquei minha vida, eu posso muito bem ficar com o meu povo, com meus filhos e netos, com aqueles que realmente me amam. Ela respondeu: – Manoel, filho de Deus pai, não seja orgulhoso. Nada nesse mundo é nosso e é hora de seguir, saiba que nada poderemos fazer por você se sua escolha for a de ficar. – Eu ficarei e nada nem ninguém vai me impedir de fazer tudo que eu ainda tenho para fazer nessa terra. Maria mais uma vez tentou me persuadir: – Manoel, seu tempo de encarnado acabou. Você terá muito que fazer do lado de cá da vida. – Já disse que ficarei com minha família e nem que o próprio Oxalá venha aqui eu irei deixá-los. – Manoel, aqui você não ficará e muito me dói vê-lo escolher o caminho mais difícil. Saiba que, de qualquer modo, estaremos ao seu lado e que a ajuda virá quando se fizer necessária, porque o Pai celeste não abandona nenhum filho. Nesse momento, começou um grande tumulto dos dois lados: choro e gritos que doíam no meu corpo do lado material; gargalhadas e ofensas do lado espiritual. Ouvi o som de mãos que batiam em minha urna funerária, enquanto diziam: – Ele será nosso, o chefe ficará muito contente. Velho feiticeiro, sua hora chegou! Eu estava desesperado, pois os gritos eram cada vez mais apavorantes e, pela última vez naquela década, eu ouvia o hino de Oxalá. Maria tentou um último contato, mas eu não lhe dei importância, embora meu corpo balançasse e eu gritasse e pedisse por ajuda mais uma vez. Quando percebi o que estava acontecendo, meu pânico foi total. Minha urna funerária descia à sepultura e eu sentia cada pá de terra bater em meu caixão, então, gritei, chorei copiosamente até que a exaustão tomou conta de mim. Lembro-me de tudo o que vi como se fora um sonho ou meros pensamentos de um velho morto, pois vi naquela hora meu tempo de criança, quando minha mãe dividia com alegria o pouco que tinha entre os filhos, depois, meu tempo de moço jovem e as primeiras manifestações da mediunidade em minha vida. Foi quando chamei por Maria, minha esposa tão dedicada e que sempre esteve ao meu lado, só que dessa vez ela não me respondeu. O nascimento dos meus filhos, de meus netos, tudo isso passou pela minha cabeça e eu ainda me perguntava: Por que fizeram isso comigo? Por que me deixaram aqui? Foi quando ouvi gargalhadas assustadoras que me enregelaram a alma e vi uma mão esquelética aparecer dentro do meu túmulo e do lado de fora uma voz apavorante me disse: – Feiticeiro, vim cobrar o que é meu por direito. A mão agarrou as roupas de chefe de terreiro, às quais eu tanto era apegado, e me puxou para fora. Era noite, não saberia dizer quanto tempo fiquei ali, exposto à chuva forte que caia e a vários espíritos que se reuniam em círculo, alguns deles com várias partes do corpo faltando, todos rindo de mim. Ao centro, sentado em meu túmulo, encontrava-se um ser alto, com capuz preto, e que olhava para o chão. Era alguém frio e sua aura negra. Eu tossia e chorava, meu corpo estava completamente dolorido, meu estômago doía sem parar e, ao inspirar, o ar queimava-me por dentro. Ele foi o primeiro a falar: – Pensei que esse encontro nunca aconteceria, amigo... – Não sou seu amigo, quem é você? Ele mais uma vez riu e os outros fizeram coro ao som horrendo. – Quem sou eu, me chame como quiser velho, você mesmo já me deu vários nomes: Tranca rua, Caveira, Veludo. Eu fui muitas coisas para você, velho, principalmente quando era para eu fazer favores em troca de migalhas, dos quais você e esta corja de infelizes que te procuravam para fazer o mau a outros precisavam... – Eu só era condutor, nunca fiz mal a ninguém. Ele respondeu: –Desse jeito eu vou sentir pena de você velho... – Por favor, eu só quero ir para casa... Mais uma vez ele riu: Casa? Que casa? Você agora é meu, irá me pagar por tudo que fiz para você. É chegada a hora do acerto de contas, seu velho maldito. Então, ele ordenou aos seus: – Acorrente-o, como ele fazia conosco. Eu não tinha força para fugir, tentei levantar, mas minhas pernas estavam fracas. Fui acorrentado e uma vez mais a escuridão foi total.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

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Refletiu a luz divina
Com todo seu esplendor
Vem do reino de Oxalá
Onde há paz e amor

O quanto somos orgulhosos é o que define o que seremos no mundo espiritual. Este momento da minha vida e que conto aqui a vocês é um dos que mais me envergonho na minha atual condição. Eu imaginava que morrer seria um tormento, que seria um momento de dor, só que estava enganado, pois, para mim, o momento de maior dor viria após a morte do corpo físico. Confesso que de muito não me lembro, mas, ao entrar no hospital naquele dia de sol, diversas sombras passavam pela minha visão. Logo imaginei que isso fosse devido a dor que eu sentia no corpo físico. Não era. Uma quantidade de espíritos já estava esperando que eu ali chegasse e, por alguns momentos, os percebi. Mas, logo tudo ficou escuro, parecia que eu estava em um sono profundo. Junto com meus pensamentos, gritos ecoaram em minha cabeça. Contudo, aquilo parecia um sonho. Enquanto ouvia as pessoas me chamarem, alguns mais contidos – "Padrinho, por que padrinho?","O que vamos fazer agora?" –, eu queria levantar, mas não sentia meu corpo. Então, comecei a ficar desesperado. Com o passar das horas, algo me acalmou: luzes verdes clarearam a escuridão. Maria, minha esposa, com seus cabelos amarrados para traz e usando um vestido branco, se aproximou de mim. Não podia ser, pois se ela estava morta! Aquilo só podia ser um sonho. Ela passou a mão em minha cabeça e disse: – Manoel, é hora de ir embora, seu corpo físico já não vive e precisamos da sua ajuda para cortar os últimos fios que o prendem a ele. – Você está louca mulher? Isso é só um sonho! – foi minha resposta. Maria sorriu com amor e, mais uma vez, colocou sua mão em minha testa. Dela saíram jatos de luzes coloridas e, então, eu pude ver meu corpo em uma urna fria. Também pude ver Antônio, meu amigo padre, com lágrimas nos olhos, enquanto jogava água sobre a urna. Meus filhos, netos e mais uma centena de filhos do terreiro cantavam o hino de Oxalá: este era o cenário do lado físico. Do lado espiritual, guerreiros vestidos com armaduras e capas vermelhas, armados de lanças e espadas não deixavam que espíritos maltrapilhos se aproximassem do meu corpo. Em alguns momentos, eles investiam contra estes guerreiros gritando e pedindo vingança: "Ele é nosso por direito", “Fizemos muitos favores para ele", “Nos entreguem o velho feiticeiro”. Outra equipe de espíritos apenas assistia a tudo, pareciam estar em oração. Entrei em desespero, me faltou o ar, comecei a me sentir sufocado: “Não, eu não posso estar morto!”, pensava. Enquanto ouvia tudo aquilo, a revolta tomou conta de mim, porque eu ainda tinha tanto a fazer! Gritava o nome dos meus netos e filhos, mas era impossível eles me ouvirem e, novamente, tudo ficou escuro. Agora, minha cabeça doía, meu estômago também e as vozes eram mais fortes: ouvia as pessoas comentarem sobre mim, sentia a dor dos mais próximos e o descaso daqueles que só estavam ali para acompanhar o evento e ter prazer com a dor alheia. Mais um momento de lucidez e mais uma vez Maria se aproximou, enquanto nesse momento eu chorava e queria ajuda para me levantar. Uma música pedia para eu acordar. Música que veio com tanta energia e amor que meu corpo, mesmo sem vida, reagiu e lágrimas de sangue rolaram por um rosto já frio e parcialmente desfigurado, tanto pela carga de energia que recebia, como também por minha luta para nele continuar. Nesse momento, benfeitores espirituais trabalhavam com equipamentos cirúrgicos e cortavam meus últimos laços com o corpo. Dois espíritos se aproximaram de mim: um negro muito alto de barba branca e uma mulher loira de vestido azul. Ambos posicionaram suas mãos sobre mim e a escuridão foi total.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Introdução




Está página on-line, O Mensageiro de Aruanda, está sendo criada para, de uma forma diferente da convencional, trazer a mensagem do espírito Manoel, que vem da cidade espiritual de Aruanda para nos dar notícias de suas experiências de além-túmulo. Muito pouco se sabe dessa cidade que foi criada para acolher espíritos que em sua vida carnal trabalharam na Umbanda ou no Candomblé, mas a espiritualidade maior vem nos dizer, através desse espírito simples, que a cidade de Aruanda é muito mais que apenas a morada dos Orixás, mas que todos os dias centenas de espíritos chegam aos seus portões com a finalidade de serem socorridos e principalmente esclarecidos. Não iremos aqui escrever sobre religiões ou dogmas, não cabe a nós fazê-lo, iremos trazer o que os coordenadores desse trabalho nos autorizaram informar, tanto para espíritas como para nossos irmãos de outras denominações religiosas. Quem foi Manoel? OrtêncioManoel do Nascimento retornou ao plano carnal no dia 18 de agosto de 1920, depois de uma intensa preparação de quase oitenta anos no plano espiritual, isso para que quando aqui estivesse seu cronograma fosse cumprido com disciplina e dedicação àquele plano. Assim sendo, aos 15 anos de idade, Manoel descobriu sua mediunidade e com ela começou a trabalhar com o Orixá Oxalá, se tornando um respeitado zelador de santo, como ele mesmo gostava de dizer. Manoel retornou ao plano espiritual 72 anos depois, no dia 23 de março de 1992. O grande homem, de nome renomado dentro da sua comunidade, amado pelas centenas de filhos de santo e lembrado por milhares de seres aos quais havia atendido na condição de médium, enfim, descobria que quase nada que planejara no plano invisível tinha colocado em prática no plano material. No entanto, só entenderemos isso com o decorrer da narrativa, embora, segundo Manoel, sua vida pouco irá ser contada aqui, uma vez que o foco principal é a cidade de Aruanda: ele é apenas um mensageiro.
Irmãos, filhos, amigos de fé, deste outro lado da vida, despertamos para as verdades que muitas vezes aí não queremos ver. Mas, o pai celeste é grandioso e nos dá a oportunidade de aprendermos e refazermos nossa trajetória evolutiva, a cada segundo de vida. Venho trazer notícias da minha cidade espiritual e, sem nenhuma pretensão de ser o dono da verdade, quero lhes contar meus aprendizados, de quando aqui acordei. Sou apenas um carteiro que me propus a lhes trazer notícias daqueles que longe estão e perto ficaram, da minha choupana emano pensamentos de agradecimento ao pai por esta oportunidade bendita, por mais uma vez poder recomeçar, depois de tanto ter errado. Mas não será das tristezas que vou falar e sim das alegrias de servir ao bem. Que Deus nos ajude nesse novo trabalho e que sua divina luz possa guiar este  velho a escrever as palavras certas para alcançar vossos corações, porque quando eu venho de Aruanda eu não venho sozinho,venho com a responsabilidade de transmitir a vocês o amor de Cristo a todos meus companheiros de viagem.
Manoel