quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Paginá 32

Eu estava maravilhado por ainda ser lembrado naquela casa e a energia de amor que recebi ali me alimentava a alma. Foi então que Henrique me disse: – Ortêncio, nem sempre foi assim. Nossos irmãos passaram por um longo processo de adaptação, pois eram muito dependentes de você, emocional e espiritualmente. Grandes batalhas foram e ainda são travadas. Nessa casa, o desequilíbrio energético e emocional vem sendo controlado, com sucesso, mas parte de sua família muito ainda terá que aprender. Aliás, alguns dos seus ainda se encontram caídos na ignorância, por isso peço que você se controle, pois iremos visitar lugares que poderão muito te perturbar. Eu apenas ouvia o amigo. Então, deixamos aquela casa, e, no mesmo instante, meu coração já se enchia de saudades! – Acalme seu coração, meu velho, – disse-me Felipe – pois ainda voltará aqui muitas vezes. Quando saímos, o preto velho ainda estava do lado de fora da casa e se despediu de nós com um “até logo”. – Todas as casas são protegidas o tempo todo? – perguntei a Henrique. – Todos são amparados, Ortêncio. O pai não se esquece de nenhum dos seus filhos e nem deixa nenhuma ovelha perdida. Todos têm seus mentores ou anjos da guarda, como é mais comum chamar por aqui. A ligação de um mentor com seu protegido encarnado é constante. Esteja onde estiver, o espírito protetor irá sentir e saber quando seu protegido necessita de amparo. Algumas casas, porém, precisam de vigilância constante por também serem alvos preferenciais de ataques. Essa, de que acabamos de sair, é uma delas, pois, além do médium espírita, ela também abriga outros médiuns, que trabalham na Umbanda e que se destacam por suas capacidades mediúnicas em seus trabalhos. Essa proteção também é usada com religiosos ou personalidades com responsabilidade em sua comunidade. Imagine, por exemplo, quantos ataques sofre um evangelizador. Quando Henrique terminou de falar, estávamos em frente a um local que eu conhecia muito bem: a casa que me abrigara por mais de trinta anos e que abrigara meu Centro de Umbanda. A visão não era das melhores no plano físico: o grande salão tinha sido demolido, as plantas que eu cultivara já não existiam e quase nada do que eu construíra no plano material permanecia. Porém, apesar da minha decepção com isso, pude verificar algo ainda mais assustador, pois, no plano espiritual, a imagem era chocante: do que havia sobrado dos muros que cercavam a casa, dali escorria uma lama negra e fedorenta; espíritos maltrapilhos estavam grudados naquela gosma e sem conseguirem se libertar; tão perdidos se encontravam em seu estado, quase vegetativo, que nem perceberam nossa presença. Ao passarmos pelo portão, homens e mulheres viciados em drogas e em sexo andavam de um lado para o outro, como zumbis, falando o tempo todo. O cenário era desesperador. Entramos em uma das duas casas que ali ainda permaneciam. Ao passarmos pela porta, um homem de pele negra, usando um capuz também negro, nos sorriu e veio ao nosso encontro, dizendo: – Sejam bem-vindos, meus irmãos, e que Jesus nos ilumine. Henrique o abraçou e disse-lhe: – Que Oxalá o abençoe, meu amigo Paulo. Como anda o trabalho por aqui? – A situação ainda requer muito carinho de nossa parte, Henrique. Este antigo centro de força ainda atrai espíritos de todos os tipos e que buscam de alguma forma se alimentarem da energia aqui acumulada. Eu, a essa altura, estava desesperado e perguntei: – Mas, o que aconteceu aqui? Por que meu antigo lar se transformou em um local de dor e sofrimento? – Ortêncio – disse-me Paulo com calma – sua casa é um grande centro de força e de socorro. Quando seu centro estava aberto, os espíritos do bem aqui trabalhavam com ajuda dos médiuns e socorriam a milhares de espíritos. Muitos pensamentos eram direcionados a este local. Porém, após seu desencarne e, consequentemente, com o fechamento do seu terreiro, tais pensamentos continuaram a ser enviados. Muitos espíritos chegavam aqui, direcionados por esses pensamentos, e, por conseguinte, começaram a ficar presos nessas energias, portanto, criando o cenário que você esta vendo. – Manoel, muitos que chegam aqui ainda são socorridos. Paulo coordena uma equipe de espíritos especializada em criações psíquicas e que vem obtendo grandes resultados. – Como Maria? Olha isso! É um verdadeiro inferno! – questionei. – Olhe com atenção. – disse-me ela. Então, eu fiz uma prece, pedindo ao alto que me acalmasse e respirei fundo. Pude, analisar o local com mais vagar: o preto era a cor predominante e, entre as centenas de espíritos que estavam ali, algumas dezenas estavam encapuzados, vestiam-se com roupas semelhantes as dos padres franciscanos, como o próprio Paulo e se destacavam ajudando aqueles que se encontravam em estado de loucura. Uma casa de madeira havia sido erguida sobre o que antes era o salão religioso e alguns espíritos eram levados para lá, deitados em macas. Como todos usavam vestes negras não deu para eu diferenciar, inicialmente, os socorristas. Perguntei ao Paulo o porquê disso. Ele sorriu e disse-me: – Ortêncio, a cor não importa. Quem foi que disse que outra cor é melhor do que a que usamos aqui? Porém, todos assim estamos para, primeiramente, baixar nossa frequência vibracional, pois precisamos ser vistos por estes irmãos. Além disso, para que eles saibam que não somos diferentes deles e, com isso, ganhamos sua confiança. Ou você acreditava que conseguiríamos nos aproximar deles de outra forma? Eu havia entendido o que o irmão queria dizer. No entanto, algo ainda me incomodava e lhe perguntei: – Como estão os moradores desse local? Como isso tudo pode afetar aqueles que por aqui moram, ou seja, no plano físico? – Venha Ortêncio, irei lhe mostrar sua família – disse-me Paulo em resposta, com ar preocupado...

Nenhum comentário:

Postar um comentário