quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

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Vendo aquele ser sobre a cama, minhas perguntas eram muitas. Mas, a primeira delas era: – Por que um jovem faria isso com a própria vida? Foi Felipe quem nos respondeu: – Vivemos em uma época, mensageiros, na qual o espaço para nossos sentimentos, dentro das famílias terrestres, vem sendo diminuído. Temos visto, comumente, menos pais aconselhando seus filhos ou ouvindo-os com carinho acerca de suas vontades. Não se tem “tempo a perder” e tudo vira a tal aborrecência, e, assim, o jovem entra em uma das fases mais complicadas da vida, sem estrutura psicológica e afetiva para o que o aguarda na vida adulta. Questionamentos sexuais, afetivos, profissionais são as maiores causas da decadência do homem moderno e tudo isso em conjunto vai afastando-o dos outros e principalmente de Deus. Os caminhos de derrocada são muitos, a consequência é apenas uma: a dor da alma. A verdade é que poderíamos evitar tudo isso, sim, já que somos nós que escrevemos nosso destino no livro da vida, uma vez que nela estamos justamente para reescrevermos nossos começos. Porém, apesar da evolução do ser individualmente, a nova geração é dependente, sentimentalmente. Cada um depende do outro, por isso precisamos saber como iremos usar essa dependência, pois é ela que te eleva ou te rebaixa. O menino Felipe terminara sua fala com lágrimas nos olhos. Mariana nos explicou quem era o espírito da cama: – Esse nosso irmão se entregou ao egoísmo e encontra-se neste estado já há alguns anos. Foi trazido para cá, pois logo despertará por completo e a proximidade com os médiuns que aqui trabalham pode e deve ajudar na recuperação. Sua família ainda sofre muito com o seu ato de desespero e um dos seus parentes próximos, também cometeu suicídio, envolvido pela culpa, e, portanto, ele tem emanado energias que prejudicam a recuperação de ambos. Tais detalhes deste caso deixaram-me ainda mais comovido e as lágrimas começaram a molhar meu rosto. Lembrei-me que muitas vezes, em minha vida terrena, me sentira triste e sozinho, carregando fardos pesados em minhas costas, como filhos, netos, meu próprio terreiro e, neste momento, como me senti envergonhado por, naqueles momentos, ter desejado a morte a fim de fugir de minhas responsabilidades. – Não se envergonhe, amigo Ortêncio, – disse Dr. Tomazine – qual de nós não teve que lutar com seus sentimentos de angústia? Ao contrário dessa vergonha de agora, você deveria se orgulhar por, então, não ter sucumbido, mas ter sido forte para continuar. Deixaríamos aquela casa com lições que jamais esqueceríamos e também tendo feito grandes amigos. Os jovens nos acompanharam de volta à sala, pois era hora de partimos. Antes, no entanto, uma grande surpresa nos deixaria muito felizes. – Bem, é chegada a hora do nossa partida, fios. – disse o preto velho com lágrimas nos olhos. E, direcionando um lindo sorriso à Helena: – A fia quer falar alguma coisa? Como era linda nossa guerreira, mesmo sem sua armadura da 3ª Legião de Ogum! Helena era de uma força e luz impressionantes, sempre emanando muita energia de amor. Ela disse: – Pai João, peço... Comandante Henrique, peço permissão para continuar nessa colônia, pois sinto que chegou a hora de eu aprender e ajudar mais no campo da medicina da alma, com os médicos que aqui se encontram. As lágrimas banhavam o lindo rosto de Helena. Henrique a abraçara e lhe disse: – Que Deus te ilumine, minha irmã, que nosso pai Ogum te proteja nessa nova batalha. O preto velho João Guiné abriu os braços e aos poucos sua fisionomia foi se transformando, suas vestimentas foram mudando e, em questão de segundos, tínhamos a nossa frente Ubirajara da 7ª Legião de Oxalá. – Que Deus esteja em vossos corações. – disse ele. – Eis que venho me despedir da filha amada, que continuará sua caminhada longe de Aruanda, mas tão próxima de nós ainda, pois os laços feitos com amor e carinho nos guiarão pela eternidade e nos farão atravessar as noites traiçoeiras. Nossa cidade se orgulha de você filha, por atender esse chamado e, principalmente, por abrir mão do comodismo, com coragem para enfrentar o novo. Tenho certeza que sobre a tutela de Bezerra, a filha ganhara muito! Não apenas conhecimento, mas amor! Tendo dito isso, Ubirajara se foi e, aos poucos, João voltava ao normal. Uma chuva de rosas brancas caiu sobre a cidade. Pouco tempo depois, entramos em nosso transporte, o qual logo atingiu velocidade considerável para entrarmos na escuridão...

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