domingo, 5 de abril de 2015

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Nosso veículos estavam preparados do lado de fora daquele castelo que tantas surpresa havia nos trazido. Os transportes tinham sofrido pequenas alterações, que Soraia achara importante promover para o sucesso de nossa perigosa missão. Lá fora, o cenário nada mudara, o local ainda escuro parecia apenas mais frio. A equipe de socorro coordenada pela Legião de Maria já havia ocupado seu veículo, nós que entraríamos na cidade estávamos parados em frente à colônia como se nos despedíssemos. Foi Federico quem me falou: - Acalme seu coração, mensageiro, pois você ainda virá aqui muitas vezes. Eu apenas sorri, era estranho notar como a tecnologia se misturava com o tradicional: pontos eletrônicos eram usados por todos nós e, ao nosso lado, soldados bem armados com armas elétricas nos davam a impressão de estarmos todos em um filme futurista. Eu me perguntava qual médium teria a coragem de passar tal informação para a frente, quando mais uma vez João Guiné esclareceu-me: Ortêncio, meu fio, quem disse que nossa equipe enfrentará este desafio sozinha? Há anos, outros espíritos e médiuns enfrentam essa batalha e, além disso, a cada dia já vêm esclarecendo  as pessoas, mas o povo da carne ainda se preocupa com coisas, digamos, inúteis para os espíritos. Por exemplo, não importa de que forma você faça a prece: o importante é que ela seja feita de dentro do coração, não importa qual movimento você utiliza para ministrar o passe magnético, desde que aqueles que o ministrem saibam o que estão fazendo. Não vamos nos apegar aos rótulos ou mesmo se as mensagens que chegaram aos viventes através de nós serão do agrado daqueles que as lerem. Infelizmente, o caminho a ser percorrido não será fácil, porém será necessário. Dito isso, fizemos uma prece pedindo o auxílio do alto e entramos no veículo. Soraia e sua equipe tomaram a cabine da frente junto com nossos amigos da Guarda de Ogum, comandados por Joana. Nós, na companhia de Augusto, tomamos a segunda parte do veículo que por causa das alterações já não era mais tão confortável e ganhara um ar militar. Em silêncio permanecemos, cada um se preparava a seu modo para a difícil tarefa. A determinada altura, o veículo foi perdendo velocidade até parar por completo, depois, por orientação de João, baixamos nossas condições vibratórias e, isso feito, eu, nessas circunstâncias, sempre me impressionava com nossa fragilidade aparente, principalmente do Preto Velho. Como sempre, respirar era minha maior dificuldade. O ar como os encarnados o conhecem é algo muito denso para o espírito. Por quase uma hora não saímos do veículo, pois tentávamos nos adaptar da melhor forma ao que sentíamos ali, nas fronteiras do mal. Então, Soraia abriu a porta do veículo. Vimo-nos sobre um pântano escuro, povoado de bichos que eu não saberia como explicar se não tivesse visto com meus olhos. O impressionante era que se tratava de insetos que se alimentavam de restos de perispíritos e que ali se encontravam já em decomposição: braços, pernas e várias outras partes de corpos humanos flutuavam no lamaçal. O pavor tomou conta de mim e me afastei da porta aos prantos, com medo, e sentindo compaixão por aqueles seres que ali sofriam. Questionei o porquê, como que seres de Deus podiam chegar àquela condição. Assim como eu, alguns amigos, inclusive médiuns da carne, e que nos acompanhavam, se compadeciam do sofrimento presente naquele local tão horrível. Soraia se mantivera em pé quase sem reação. O Preto Velho João, após uma prece regada a lágrimas se mantinha em silêncio. Henrique se ajoelhara e também se mantivera em prece silenciosa. O mesmo fizeram Pena Branca, Augusto. Cobra Coral pegara seu arco e atirara flechas, que explodiram no ar, clareando o vale, enquanto o guardião Felipe cantara um lamento em forma de prece: “Ogum de lei não sofre tanto assim, óh Ogum de lei não me deixe sofrer tanto assim. Quando morrer, vou passar lá em Aruanda, Saravá Ogum, Saravá seu Sete Ondas. O pedido do guardião fora sentido, sofrido, e, quando ele terminou seu lamento, uma luz azul nos envolvia, nos dando a certeza de que fôramos ouvidos. A Equipe de Glória saíra do veículo de socorro e começara a recolher aqueles que, por compaixão do pai celestial, deveriam ser socorridos...

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